Municípios resolveram pressionar parlamentares para evitar o que definem como uma “bomba fiscal” estimada em R$ 70 bilhões por ano a partir de 2022. Para isso, os prefeitos tentam emplacar uma agenda na última semana de trabalhos do Congresso que envolve rejeitar o piso da enfermagem e conceder um reajuste menor para o salário do magistério, entre outras medidas que desafiam os gestores municipais, preocupados com a capacidade da arrecadação em 2022.
A tentativa dos prefeitos é de evitar a queda na receita e impedir a aprovação de projetos que aumentam gastos sem novas fontes de custeio para os cofres municipais. Após os repasses feitos em função da pandemia de covid-19, as transferências do governo federal tendem a cair no próximo ano. Por outro lado, há pressão de servidores públicos por reajustes.
Estudo da Confederação Nacional de Municípios (CNM), ao qual teve acesso o Estadão/Broadcast Político, aponta um impacto de R$ 70 bilhões por ano com medidas que podem ser votadas no Congresso e decisões tomadas pelo Supremo Tribunal Federal (STF). “É uma bomba que já existe, não é uma bomba montada”, afirmou o presidente da CNM, Paulo Ziulkoski.
Revisão do magistério
Na Câmara, os prefeitos voltaram a cobrar a aprovação de um projeto para alterar a regra de cálculo do piso do magistério. Atualmente, o valor é estipulado de acordo com o custo por aluno do Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação (Fundeb). Para o ano que vem, o reajuste previsto é de 31,3%. O projeto defendido por prefeitos adota o INPC (índice de inflação) acumulado do ano anterior como parâmetro, sem aumento real. Até novembro, o INPC acumulou 11,08%. Sem o projeto, a confederação calcula um impacto de R$ 28,7 bilhões para os municípios.
Paralelamente a um piso menor, os municípios querem aprovar uma Proposta de Emenda à Constituição (PEC) para livrar de punição quem não investiu o mínimo exigido pela Constituição na educação na pandemia de covid-19. Esse combo de demandas enfrenta resistência de professores e outros profissionais ligados à área, que prometem fazer pressão no Congresso do lado contrário.
“É um contrassenso ao que os próprios prefeitos defendem, que é a valorização dos profissionais. Além disso, é um discurso contraditório. Querem ser liberados de gastar os 25% na educação. Recurso tem, falta vontade política e planejamento”, afirmou o presidente da Confederação Nacional dos Trabalhadores em Educação (CNTE), Heleno Araújo.
Piso para enfermagem
Os prefeitos tentam barrar a votação do piso da enfermagem, aprovado pelo Senado e pendente de análise na Câmara. A proposta institui um piso de R$ 4.750 para os enfermeiros. Os municípios, no entanto, reclamam da falta de financiamento para cobrir o pagamento com os profissionais a partir de agora. O impacto calculado é de R$ 8,73 bilhões.
A conta da bomba fiscal considera uma queda de arrecadação de R$ 13,7 bilhões com a reforma do Imposto de Renda, aprovada na Câmara e engavetada pelo Senado. Há ainda uma perda calculada de R$ 15,5 bilhões com a mudança na cobrança do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Prestação de Serviços (ICMS) sobre os combustíveis, também parada no Senado, somada à decisão do STF de barrar a cobrança de alíquotas de ICMS mais altas sobre o fornecimento de energia e telecomunicações.
Além disso, os municípios alegam que podem ficar sem R$ 3 bilhões para despesas da assistência social em função do Orçamento autorizado e não pago pelo governo federal. “As perdas estimadas para os municípios, de aproximadamente R$ 70 bilhões, poderiam manter, em termos comparativos, o orçamento da assistência social por cerca de 29 anos”, conclui o estudo apresentado pela CNM.
A PEC dos Precatórios, promulgada recentemente, garantiu o parcelamento da dívida previdenciária dos municípios, que totaliza R$ 126,5 bilhões, com redução de R$ 36,3 bilhões de juros e multas. Ainda assim, as prefeituras acionaram a Justiça para cobrar mais de R$ 150 bilhões da União em função de repasses ao Fundo de Participação dos Municípios (FPM), uma bola de neve que pode gerar novos precatórios para o governo federal. “A União deve muito mais para nós do que nós devemos para ela”, afirmou o presidente da CNM. “Por isso, nós tivemos que entrar em juízo agora, porque a União não respeita os municípios. A federação brasileira é um atropelo.”
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