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*Arthur Teixeira Junior

Imagem: DivulgaçãoClique para ampliarArthur Teixeira Junior(Imagem:Divulgação)Arthur Teixeira Junior
Hoje abro o Boletim Interno, como faço todas as manhãs antes de começar a trabalhar, e: bingo! Lá estou eu novamente, relotado em um setor que nada tem a ver com qualquer atividade na qual já trabalhei na vida!

Embora tenha feito o antigo ginásio em um dos melhores colégios particulares de São Paulo, foi no ensino público que me formei no Colegial. Logo após, empreguei-me em uma empresa pública do Governo Estadual, que me propiciou formação superior na Universidade de São Paulo e intenso treinamento no que havia de mais avançado em termos tecnológicos na época. Durante 15 anos estudei, fui treinado, aperfeiçoado e recebi salários graças ao Poder Público, até sucumbir, no canto da sereia do Plano Cruzado, a uma generosa oferta do Setor Privado.

Em 1999, depois de sofrer grave acidente que me deixou com seqüelas físicas, fui descartado por este mesmo Setor Privado, como se descarta uma lata vazia de refrigerante, após sugado seu conteúdo. Em Teresina, passei fome e não tinha dinheiro nem para procurar emprego. Catei muito lixo para comer naquele container que até hoje podemos ver defronte o Mercado da Piçarra.

Quando fui aprovado em concurso para o Serviço Público, não foi somente a satisfação de agora ter um emprego digno, mas também de poder retribuir ao Estado aquilo que este outrora havia me proporcionado. Logo após a posse, uma supervisora do Setor Pessoal levou-me solenemente até o auditório da Repartição e lá, sobre a bancada nobre, abriu um amplo mapa onde estava todo o organograma da Seccional.

“_Em qual setor você se encaixa?” – perguntou-me desafiadora.

Expus-lhe minha formação técnica, minha larga experiência em construção civil, em manutenção predial, em comando de pessoal operacional...

“_Excelente” – exclamou com um sorriso triunfante – “era de quem necessitávamos. Vamos colocá-lo provisoriamente em um setor burocrático para em poucos dias relotá-lo em sua área de especialização...” – afirmou, enchendo-me de satisfação e esperança.

E lá fui eu carimbar e numerar folhas de papel, 35 horas por semana, um serviço que em poucas horas poderia treinar um chipanzé para fazê-lo mais eficientemente. Corei de vergonha quando recebi meu primeiro contracheque. Até hoje faço semelhante serviço, em diversos setores da organização. Carimbando e numerando. Sinto-me como aquela profissional que não tem outra opção, faz sua suja tarefa em troca de dinheiro e, por mais que inove nas formas, raramente sente prazer com isto.

Fui remanejado para diversos setores, mas nunca mais perguntaram onde eu queria atuar ou o quê gostaria de fazer, onde seria mais produtivo. Comecei trabalhando no sexto andar deste prédio. Fui relotado para um setor no quarto andar. No último ano, trabalhei no primeiro. Hoje assumo minhas funções em um setor situado no subsolo. Após a publicação desta crônica, certamente serei relotado para o inferno.
 
*Arthur Teixeira Junior é articulista e escreve para o GP1

*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1

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