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Haitianos saem em massa do Brasil com destino aos EUA

Casa do Migrante, em São Paulo, chegou a abrigar 400 refugiados do Haiti, e não há mais nem um.

Conhecido como “centro dos haitianos”, o bairro do Glicério, em São Paulo, não tem mais a tradicional concentração de migrantes em frente à Paróquia Nossa Senhora da Paz. A Casa do Migrante, que em 2015 abrigou mais de 400 pessoas, hoje tem apenas angolanos e venezuelanos. Enquanto isso, o número de haitianos apreendidos nos EUA passou de 5,2 mil, entre outubro de 2019 e setembro de 2020, para 30,7 mil, entre outubro de 2020 e agosto de 2021.

O Brasil, que um dia foi abrigo para haitianos, agora serve como ponto de passagem rumo aos EUA e cria uma nova crise para o presidente americano, Joe Biden. “Muita gente está indo embora, tentando chegar aos EUA. Aqui mesmo, tem mais gente que está se preparando para ir. Eu ainda vou ficar, meu marido e minha filha estão na República Dominicana”, conta ao Estadão a haitiana Mor A’nna, que vende bananas na porta da paróquia. Falando espanhol, ela explica que não aprendeu o português e tem vergonha de mostrar o rosto.

A última vez que um grande número de haitianos se reuniu na frente da paróquia no Glicério foi há cerca de duas semanas, em uma ação da embaixada haitiana no Brasil para regularizar passaportes e documentos de identidade – na ocasião foram renovados 2 mil passaportes de haitianos de São Paulo, Minas Gerais, Rio de Janeiro, Paraná e Santa Catarina e há uma lista de espera de mais 3 mil, segundo o padre Paolo Parise.

Em Washington, as imagens de milhares de haitianos acampados embaixo de uma ponte no Texas e alguns sendo “caçados” por agentes a cavalo levaram a uma série de críticas às políticas migratórias americanas. Para Gabrielle Oliveira, professora da Faculdade de Educação de Harvard e pesquisadora de migrações e seu impacto nas crianças, uma falha de comunicação sobre a extensão da proteção temporária dada por Washington aos haitianos que já vivem nos EUA causou o grande fluxo migratório.

“Biden disse que mudaria as regras, mas para quem já estava nos EUA e não para quem chega. Mas, como isso foi disseminado pelo WhatsApp? Se você chegar à fronteira também vai ganhar proteção – e não é verdade. Todas as políticas foram mal comunicadas e o fluxo ficou dessa forma”, explica.

Os haitianos que deixam o Brasil usam na maioria das vezes a rota que um dia fizeram para chegar ao País. Muitos vão até Roraima, de onde cruzam por Amazonas e Mato Grosso, passando para Bolívia e Chile, de onde partem para a América Central até o destino final. Aqueles que estão com o passaporte em dia tentam um voo até o México e, de lá, seguem de ônibus para os EUA. A parte mais difícil do trajeto para os que fazem o caminho da América do Sul aos EUA é atravessar a selva de Darién, entre Colômbia e Panamá. Segundo o Serviço Nacional de Migração do Panamá, o número de migrantes haitianos que passaram pelo Tapón de Darién aumentou mais de seis vezes de 2020 para este ano.

Na América Central, a violência é o maior obstáculo. Honduras e Guatemala estão entre os países mais perigosos do mundo. No México, um dos desafios é passar sem ser pego pelos cartéis. “Em 2011, um levantamento mostrou que, em seis meses, 10 mil migrantes foram sequestrados por cartéis. Alguns são mortos, outros precisam trabalhar para os narcotraficantes”, explica Adam Isacson, diretor do Washington Office on Latin America (Wola).

Segundo ele, um dos motivos de os coiotes pedirem um alto valor para enviar as pessoas por essa região é o pagamento a grupos criminosos e a corrupção. “Se você tem dinheiro, sua viagem é mais segura e garantida. Em 2019, um traficante de pessoas na Guatemala contou que US$ 15 mil era o valor médio para passar da América Central aos EUA. Uma parte vai para os cartéis no México, outra, geralmente uns US$ 8 mil, para autoridades no caminho.”

Para aqueles que chegam à fronteira dos EUA, o desafio é ficar no país. Usando uma regulação sanitária aplicada ainda durante o governo de Donald Trump, Washington iniciou as deportações para o Haiti. Desde o dia 19 de setembro, mais de 5,5 mil haitianos foram deportados. “A pandemia ainda não acabou e esses haitianos continuam deixando a América do Sul. Num mundo perfeito, eles fariam o pedido para receber o status de refugiado e o processo seguiria, mas estamos muito longe disso. Nada permite que eles fiquem e vivam nos EUA neste momento, principalmente os que chegam da América do Sul”, disse Isacson.

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