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Papa Francisco envia novas mensagens ambivalentes sobre os direitos LGBTQ

Uma nota encorajadora do papa Francisco coroou uma semana especialmente confusa sobre os direitos LGBTQ.

Um líder nos esforços da Igreja Católica para chegar aos católicos LGBTQ revelou no domingo que o papa Francisco lhe enviou uma mensagem profundamente encorajadora, coroando uma semana especialmente confusa sobre a atitude do Vaticano no tocante aos direitos dos gays.

Na terça-feira, o Vaticano confirmou ter manifestado ao Estado italiano suas sérias preocupações sobre o projeto de lei debatido no Parlamento que aumenta as proteções para membros da comunidade LGBTQ. Dias depois, o segundo no comando do Vaticano insistiu que a igreja não tem nada contra os direitos dos gays, mas estava se protegendo de modo a não permitir que crenças fundamentais da igreja fiquem expostas a acusações de discriminação.

Quase oito anos depois de o papa Francisco ter se referido à questão dos católicos gays com a frase “Quem sou eu para julgar?”, ficou cada vez mais difícil discernir qual a posição dele sobre o assunto. Há uma discordância crescente entre sua linguagem inclusiva e as ações da igreja.

O resultado é uma confusão e uma frustração entre os apoiadores liberais do papa que se perguntam se ele continua determinado a criar uma igreja tolerante e luta para entender os contornos que mudam rapidamente de um problema difícil, ou se na verdade ele é um conservador social tentando agradar a todos.

O que está claro é que a nova mensagem será usada como novo elemento de debate numa batalha dentro da igreja entre os progressistas frustrados, que esperam que uma mensagem inclusiva do papa finalmente conduza a mudanças, e os cautelosos conservadores que desejam que a Igreja mantenha suas tradições. O próprio serviço de imprensa do Vaticano noticiou posteriormente que o Papa havia enviado a mensagem.

Na carta escrita à mão, datada de 21 de junho e tornada pública no domingo, o papa Francisco elogiou e agradeceu ao reverendo James Martin, conhecido jesuíta e autor de um livro sobre como chegar aos católicos LGBTQ.

“Vejo que o senhor busca continuamente seguir o exemplo de Deus. O senhor é um padre para todos os homens e mulheres do mesmo modo que Deus é um Pai para todos os homens e mulheres. Rezo para que continue neste caminho, se mantendo próximo, compassivo e com grande sensibilidade”.

Essas palavras certamente ajudarão os apoiadores liberais do Papa, muitos deles profundamente desanimados pela resposta, em março, da Congregação da Doutrina da Fé a um questionamento quanto a se o clero católico tem autoridade para abençoar uniões gays.

“Negativo”, foi a resposta, aprovada por Francisco.

Duas pessoas que apoiam os direitos dos gays e são próximos do papa afirmam que ele lhes disse que cedeu sob pressão da Congregação, decisão que lamentava e pretendia retificar. O Vaticano não se manifestou sobre os pedidos para comentar o fato.

Mas o Cardeal Gerhard Ludwig Müller, que o papa demitiu do cargo de prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé em 2017, disse que a ideia era absurda. “O Papa é o Papa”, afirmou, acrescentando que Francisco era claramente o responsável por esses assuntos.

Müller e outros prelados disseram que o Papa, a nível pessoal, simplesmente não gosta de ferir os sentimentos das pessoas.

“Ele deseja ser um pastor e estar próximo das pessoas”, disse Müller. “É mais fácil ser o querido de todos do que dizer a verdade. Ele não gosta de um confronto direto”, acrescentou.

O reverendo James Martin, que com frequência é atacado pelos conservadores da igreja, tornou pública a carta depois de se referir a ela numa conferência virtual para pastores e leigos.

Nessa carta o Papa diz que o padre jesuíta ecoa Jesus no sentido de que seus ensinamentos estão “abertos para cada um e todos”. E concluiu com uma promessa de orar pelo “rebanho” de Martin.

Francisco surpreendeu os fiéis e o público secular mais habituado a censurar a homossexualidade e o casamento de pessoas do mesmo sexo quando foi questionado por jornalistas sobre um padre que seria gay e respondeu: “Quem sou eu para julgar?”.

Seu documento emblemático de 2016 sobre a família, intitulado A Alegria do Amor, rejeitava o casamento de pessoas do mesmo sexo, mas pedia aos padres para acolherem as pessoas em relações não tradicionais, como os gays.

Mais recentemente ele manifestou seu apoio a uniões civis de pessoas do mesmo sexo. Seus comentários não mudaram a doutrina da Igreja, mas significaram uma importante ruptura no tocante a seus predecessores.

Suas observações foram feitas numa entrevista em 2019 para a Televisa mexicana, mas o Vaticano censurou a notícia e a gravação da entrevista apareceu somente num documentário em outubro de 2020.

Os católicos liberais ficaram decepcionados de novo na semana passada quando o Vaticano confirmou que o ministro do Exterior da Santa Sé, o arcebispo Paul Richard Gallagher, havia entregue uma carta ao embaixador italiano em que a Santa Sé expressava reservas quanto ao projeto legal que acrescentará novas cláusulas abrangendo os indivíduos LGBTQ a uma lei já existente que estabelece que a discriminação, a violência ou incitação com base na raça ou religião é um crime que pode ser punido com até quatro anos de prisão.

A Igreja interveio para mudar o projeto pois temia que a lei pudesse obrigá-la legalmente a realizar casamentos de pessoas do mesmo sexo ou pregar ideias mais liberais sobre gênero nas escolas católicas, disse uma autoridade dentro da igreja.

Alessando Zan, patrocinador da lei, disse que tais preocupações eram grotescas e não estavam refletidas no projeto legal.

Mas o papa claramente aprovou a intervenção, disse o cardeal Giovanni Battista Re ao jornal Il Messagero na terça-feira.

A reação foi forte e colérica de italianos que acusam o Vaticano de interferir no processo democrático do Estado e também dos gays católicos confusos e frustrados que novamente viram o Papa, não obstante tudo o que tem afirmado, atuando contra eles.

Num esforço aparente para conter os danos, o cardeal Pietro Parolin, secretário de Estado do Vaticano e a segunda autoridade depois do papa, divulgou um comunicado a respeito na quinta-feira.

Afirmou que o Vaticano não está tentando bloquear a lei, mas está preocupado que a linguagem vaga do projeto legal e a enorme liberdade dos juízes italianos levem a considerações de que práticas fundamentais da igreja são discriminatórias e puníveis como crime. E ele insistiu que a oposição do Vaticano não foi motivada por alguma hostilidade com relação aos gays.

“Nós nos opomos a todo comportamento ou gesto de intolerância ou ódio com relação às pessoas por causa da sua orientação sexual”, disse ele.

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