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Francisco de Jesus critica lei sancionada por Wellington Dias sobre violência contra a mulher

A lei obriga os hospitais públicos e particulares a notificarem às delegacias especializadas casos de mulheres que apresentem indícios de violência seja física, psicológica ou sexual.

Em entrevista ao GP1, o promotor de Justiça Francisco de Jesus Lima, que atua no Núcleo de Promotorias de Justiça de Defesa da Mulher Vítima de Violência Doméstica e Familiar (Nupevid), falou sobre a decisão do governador Wellington Dias (PT) de sancionar lei que obriga hospitais a informarem casos de violência contra a mulher.

A lei obriga os hospitais públicos e particulares a notificarem às delegacias especializadas casos de mulheres que apresentem indícios de violência seja física, psicológica ou sexual. A notificação deve acontecer mesmo sem o consentimento da mulher.

Para o promotor, por mais que a iniciativa seja válida, o governo deveria entender que só comunicar a delegacia não irá resolver o problema, pois existe no Estado toda uma rede de proteção que também deveria ser acionada nesses casos.
Imagem: Bárbara Rodrigues/GP1Francisco de Jesus(Imagem:Bárbara Rodrigues/GP1)Francisco de Jesus
“Eu acho válida a iniciativa, agora antes de se fazer uma lei, acho que as autoridades têm que buscar saber realmente as causas de violência contra a mulher. Como são várias as causas, não podemos abrir para essa mulher apenas a porta da delegacia. Temos que abrir para essa mulher várias portas. Na medida que abrimos as diversas portas, nós atacaremos as raízes do problema. Ele quer enfrentar somente através da delegacia, quando através da legislação ele pode criar políticas públicas. O legislador quando fez não atentou, não ouviu profissionais da área, como se a única porta para enfrentar essa situação fosse a delegacia. Acho que esse legislador não conhece a rede. Está na hora de saber que existe uma rede de atendimento. Não é só delegacia. Nesse caso acho até importante a participação dos hospitais, mas de enviar a mulher não somente para a delegacia, mas para as coordenadorias de políticas públicas. Aos demais órgãos de proteção, ao próprio Ministério Público”, declarou Francisco de Jesus.

A lei afirma que a notificação deve acontecer mesmo sem o consentimento da mulher. Para o promotor isso depende de duas situações bem específicas, em casos condicionados e incondicionados, e que a mulher precisa ser informada que o caso será repassado para uma delegacia.

O promotor Francisco de Jesus afirma que a lei deveria ser aplicada para essas duas situações. “São dois tipos de situação, a condicionada e a incondicionada. Tem a situação condicionada a decisão da mulher. Vou te dar um exemplo, a mulher é xingada dentro de casa, eu tenho um crime de injúria, calúnia ou difamação, mas é uma ação que ela vai optar se vai querer ou não denunciar. Ela tem um abalo psicológico. Então se ela se dirigir a esse hospital, mas ela não quer ir à delegacia. Então os hospitais e o Estado tem que respeitar. Agora se ela tem uma lesão corporal, como um tapa no rosto que ficou roxo e ela vai ao hospital atrás de medicação. Aí sim o médico tem que curar não só a ferida, mas tem que curar também os outros aspectos. De encaminhar ela, pois não depende mais dela. Se recebem essa mulher, tem que orientar ela dos seus direitos e encaminhar ela a um dos órgãos de proteção, para a rede de atendimento”, afirmou.

Para o promotor, a lei erra porque não só a delegacia deve ser informada como também a rede de atendimento, com objetivo de proteger e ajudar aquela mulher. Pois só um inquérito policial não dará todo o suporte que a mulher precisa.
Imagem: Bárbara Rodrigues/GP1Francisco de Jesus(Imagem:Bárbara Rodrigues/GP1)Francisco de Jesus
“Acho que você tem que respeitar a autonomia da mulher em ações públicas condicionadas. Já nas incondicionadas você comunica [o órgão competente]. Informa para a mulher que o caso vai ser comunicado e informa sobre a rede de atendimento. Aí ela faz parte da rede. Por exemplo, se ela disser que sofre essa violência por problemas de renda porque não consegue arranjar emprego. Você informa para ela que existe a Coordenadoria de Políticas Públicas, que lá existem capacitações. Onde ela pode ser capacitada em alguma área. Ou por exemplo, a mulher fala que isso [a agressão] acontece porque ainda são casados. Abrimos o procedimento e encaminhamos o caso para a Defensoria Publica para fazer o divórcio. Ou então, ela diz que apanha porque sai para trabalhar e os filhos ficam em casa. O marido reclama porque ela tem que ficar em casa cuidando dos meninos. Ela fica então sofrendo agressões verbais. Então, a gente vê a creche mais próxima, e oficia as escolas do município para conseguir uma vaga para os filhos, pois assim ela pode sair para trabalhar. Se eu conseguir o lugar para os filhos, eu findo na raiz, sem precisar obrigatoriamente ela ir na delegacia, quando ela não quer”, explicou o promotor.

Outro ponto apontado na lei é que se na região não tiver delegacia especializada no combate à violência contra a mulher, a notificação se fará na delegacia ou posto policial próximo ao hospital onde ocorreu o atendimento à vítima.

Para Francisco de Jesus, o governo precisa capacitar os delegados para receberem as vítimas. “O mais grave é quando se estende ao interior que não há delegacia especializada. O Estado capacitou esses agentes que lá estão, para que eles possam receber bem essa mulher? Ela vai ser bem recebida ou vai ser mais uma vez revitimada pelo Estado? Se faz necessário que capacite os profissionais, ouça a mulher e a encaminhe para um lugar que possa ser resolvido o problema. Jogar só para a delegacia acho que nem as próprias delegadas querem. Se resolve o problema com políticas públicas. Com ações preventivas”, afirmou.

O promotor afirmou ainda que o mesmo problema acontece com a lei federal de nº 10.778, de 24 de novembro de 2003, que estabelece a notificação compulsória, no território nacional, do caso de violência contra a mulher que for atendida em serviços de saúde públicos ou privados. A lei não informa nem quais os órgãos devem ser notificados.
Imagem: Bárbara Rodrigues/GP1Francisco de Jesus(Imagem:Bárbara Rodrigues/GP1)Francisco de Jesus
“Padece do mesmo mal. O legislador não está conhecendo a realidade. O legislador quer fazer por lei o que é uma questão social. A lei é um instrumento, mas para isso tem que haver a conscientização”, finalizou o promotor.

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