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*Arthur Teixeira Junior

Imagem: ReproduçãoArthur Teixeira Junior(Imagem:Reprodução)Arthur Teixeira Junior
Costumam chamar-me de “encrenqueiro”. Minhas filhas não me acompanham mais ao supermercado. Mas acho este “rótulo” uma tremenda injustiça, pois, exigir um serviço público com qualidade e requerer das pessoas um comportamento solidário em ambientes coletivos não é ser encrenqueiro, é ser cidadão.

Algumas pessoas assumem um cargo público e acham que foram aprovadas em um concurso para semideus. A primeira coisa que o servidor incompetente faz é afixar um cartaz no guichê de atendimento alertando que “desacatar servidor público é crime, passível de prisão”. Quando você deparar-se com uma placa desta, tenha certeza: ali trabalha um incompetente. Quem deveria ser preso eraele. O servidor público tem obrigação de atender bem quem paga seus salários, que somos nós, salários estes geralmente maiores que a média de outras categorias de trabalhadores. E eu reclamo mesmo, quem tiver cacife que mande prender-me. Ou, se souber escrever, que faça uma representação contra o reclamante.

Acordo pelas manhãs de sábado e domingo, obrigatoriamente, no mesmo horário que os dois cachorros de meu vizinho, criados como bebês no interior de uma casa de 50 m2, com mais três humanos. Este mesmo vizinho diz que cria gatos. Não é verdade. Quem cria os cerca de vinte gatos que ele diz serem dele, somos nós, os vizinhos. Afinal, eles passeiam, brigam e namoram sobre nossos telhados, geralmente à noite. Defecam e urinam em nossos quintais e comem os restos do lixo que estava arrumadinho nos sacos defronte nossas casas, nos obrigando a sempre refazermos as embalagens.

Fiz as contas: se cada um dos vinte gatos que ele diz criar produzir 100 g de dejetos por dia, totaliza 2 kg por dia, ou sessenta quilos por mês. Ao final do ano serão 720 kg de merda de gato despejados em nossos quintais. Organizei meus vizinhos vítimas para irem juntando tudo o que recolhem em caixas. No próximo Natal daremos um grande presente a este vizinho “criador” de gatos...

Mas o cúmulo da anticidadania é visto nos supermercados de nossa cidade. Começa pelo estacionamento. Projetado para 40 vagas, só abriga 20 veículos, pois a maioria dos carros estaciona ocupando duas ou mais vagas.

Você aguarda pacientemente sua vez na fila dos frios ou do açougue, enquanto alguns clientes avançam pela lateral, crendo que a má educação faz parte da extensa lista de atendimento prioritário. Na zona leste de Teresina existe um supermercado que tem fila para furar a fila do açougue e um atendente exclusivo para os furões. A institucionalização da esculhambação. Quem já foi lá sabe de onde estou falando.

Para pagar suas pequenas compras, você dirige-se ao caixa rápido. Na sua frente uma senhora com um único pacotinho de açúcar nas mãos. Vai ser rápido, pensa. Quando chega a vez dela, ela vira para a fila do caixa ao lado e berra:

-Vem, Gertrudes. Aqui já chegou na vez.

E lá vem a Gertrudes, com um carrinho cheio de compras e toma a sua frente.

Experimente tentar reclamar com elas, mesmo argumentando que ali é um caixa rápido para no máximo dez volumes. Elas começaram a falar alto, a simular falta de ar, a ameaçar desmaios, a chamar seu filho que é policial, a argumentar que é diabética, cardíaca, sofre dos “nelvos”, e em breve todo o supermercado estará contra você. É melhor deixar para lá e ter paciência.

Apesar daquele caixa não ter empacotador, as duas ficam paradas, uma olhando para o operador e a outra para o monitor do caixa, ambas sem enxergar nada. As compras, rapidamente passadas pelo leitor ótico, acumulam-se do outro lado do balcão. Gertrudes sabe que ao final terá que pagar a conta, mas somente inicia a busca ao dinheiro segundos depois do término de toda a operação. De sua enorme bolsa, após uma alucinante garimpagem, retira uma bolsa vermelha menor. De dentro desta, sai um saquinho plástico todo enrolado, cheio de papéis velhos e com uma pequena bolsinha tipo portamoedas. Dentro desta bolsinha, bem socadinho e totalmente amassado, está o dinheiro. Parece couro de rato.

Após o operador do caixa desamassar pacientemente um monte de cédulas de pequeno valor, contá-las, cai na besteira de perguntar “a senhora tem dez centavos?”. Antes que ela comece a vasculhar novamente aquela enorme e ridícula bolsa, adianto-me e dou os dez centavos ao caixa, com um sorriso condescendente amarelado.

Gertrudes começa então a embalar suas compras, após receber o troco. Um produto em cada saquinho. E eu pacientemente esperando para começar a passar minhas compras. Depois de alguns minutos e de várias desistências na fila atrás de mim, preparo-me para ser atendido. Mas, de repente, Gertrudes volta-se para o operador:

-Tem crédito da TIM?

E depois eu que sou encrenqueiro...

* Arthur Teixeira Junior é funcionário público

*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1

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