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Justiça do Trabalho do Piauí: Uma visão panorâmica


*Pedro Laurentino

Criada em 1934 ainda como segmento administrativo, incorporada ao poder judiciário na Constituição de 1946, a instituição da Justiça do Trabalho é sem dúvida uma conquista dos trabalhadores brasileiros. Subtraída em seus direitos, espoliada no mais das vezes, elo mais frágil da relação de trabalho, a classe obreira encontrou no Direito e na Justiça do Trabalho o amparo jurídico para clamar por justiça.

Surge a pergunta: tem a Justiça do Trabalho cumprido a missão que lhe foi delegada historicamente? No ano em que o Tribunal Regional do Trabalho do Piauí caminha para a sua maioridade – completa 18 anos em dezembro próximo – essa indagação encontra algumas respostas a partir de resultados aqui apresentados sobre este ramo da justiça no Piauí.

Os dados elencados a seguir são frutos de pesquisa realizada tomando por base os cerca de 38.500 processos judiciais que se encontram acondicionados no Arquivo Geral do TRT. Criteriosamente, de forma a obedecer a proporcionalidade por ano de arquivamento, foram selecionados 130 processos ao acaso, mas dentro de uma metodologia em que os resultados alcançados estejam o mais próximo possível do universo pesquisado.

Os arquivos, em geral, contam a vida das pessoas e das instituições. Com o arquivo do TRT não poderia ser diferente. Os prazos que os trabalhadores precisam aguardar para ver satisfeitos os seus direitos, o mérito das decisões, o percentual de processos conciliados, os setores econômicos que mais demandam a justiça...tudo isso é possível ser revelado se tivermos tempo para ouvir a eloqüência dos processos arquivados.

Provavelmente os dados encontrados não se diferenciem dos de outros Tribunais do Trabalho pelo Brasil afora. Vamos aos números.

Justiça que tarda é justiça que falha

O tempo médio de conclusão de um processo na Justiça do Trabalho do Piauí é de inacreditáveis 1.950 dias, considerando as datas de autuação e a de decisão de arquivamento dos mesmos, quando todas as obrigações foram satisfeitas. Traduzindo, um obreiro passa em média 5 anos e 4 meses para receber as horas extras, as férias vencidas, a multa de rescisão contratual, a periculosidade, a insalubridade, o aviso prévio, etc, que lhe foram subtraídos.

Mesmo considerando a necessidade de assegurar o mais amplo exercício do contraditório, garantindo às partes o direito aos recursos ordinários, aos agravos e aos embargos, as normas processuais por si não explicam a extensão de tal lentidão, que comprova a máxima de que a justiça é falha porque tardia. Cada Juiz do Trabalho de 1ª Instância no Piauí tem uma carga de 1711 processos/ano, nas fases de conhecimento e de execução( Planejamento Estratégico do TRT 2008/2009). Esta carga é repassada aos oficiais de justiça, analistas e técnicos que, por mais que queiram, não conseguem agilizá-los.

A verdadeira resposta a tal estrangulamento é que a oferta é infinitamente inferior à demanda. Em Teresina são autuados cerca de 18 mil processos por ano e apenas 6 mil são concluídos. Necessita-se, urgentemente, de universalizar também a justiça célere, com a criação de mais varas e a contratação de mais juízes e servidores já. Assim como não basta ter escola, é preciso ter a escola de qualidade, também não basta ter justiça, há que ter uma justiça rápida.

A título de pitoresca tragédia, foi encontrada ao acaso uma reclamação trabalhista que passou 37 anos e 5 meses tramitando (13.654 dias), assim como houve caso de reclamante que faleceu no transcorrer do demorado processo.

Agilizar ou conciliar, eis a questão

A justiça do trabalho do Piauí não confirma inteiramente o papel de guardiã do ramo do direito que ampara o trabalhador contra as artimanhas montadas pelos patrões nas relações trabalhistas. É verdade que somente 19,50% das demandas geradas pelo empregado são indeferidas. Somando-se aos 13,13% de desistências da parte, pode-se concluir que aproximadamente 1/3 daqueles que a procuram não materializam seus anseios. Dos 2/3 restantes, 41, 92% das ações são julgadas procedentes mediante decisão da autoridade judicial e 25,45% são decididas por acordo. Note-se que parte destas lides são conciliadas na fase de execução, quando o elo mais fraco da relação processual já não suporta mais os entraves protelatórios.

Registre-se ainda que os acordos feitos são em média correspondentes a 40,49% do valor da causa. Em outras palavras, tenho direito a R$ 1.000,00, mas aceito receber R$ 400,00 porque não há como esperar 5 anos e 4 meses para que a justiça se faça.

A política de conciliação na Justiça do Trabalho é a menina dos olhos do Conselho Nacional de Justiça. À luz desses dados e dos interesses dos trabalhadores em geral há que se perguntar se este é o caminho realmente a ser seguido para conseguir celeridade judicial.

O poder empregador do Estado

40,77% de quem procura a Justiça do Trabalho do Piauí são empregados do setor público, considerando as três esferas da administração direta e indireta e as empresas públicas e de economia mista. Confirma-se portanto, no caso do Piauí, que o Estado é o maior empregador isoladamente, cumprindo um importante papel na geração de emprego.

Pela ordem, a construção civil (9,00%) e o comércio ( 7,00%) seguem à distância no setor privado.

Por ramo de atividade, o setor primário (rural) demanda 2,31% das ações, a indústria comparece com 12,31% e o setor de serviço é destacado o que mais demanda a Justiça do Trabalho com 85,38% das ações. Confirma-se que em Teresina e nos municípios vizinhos o setor de serviços é o motor da economia.

Outro fato tabulado é o que diz respeito à assistência dos órgãos de classe junto aos seus representados nas lides averiguadas. Somente 15% dos reclamantes são acompanhados formalmente por seus sindicatos, ressalvando-se a boa performance do Sindicato dos Urbanitários que assiste a quase 100% das demandas de seus associados, seja contra a Cepisa, a Agespisa ou a Cohab.

Justiça a baixo custo

Segundo dados do planejamento estratégico do TRT do Piauí cada piauiense desembolsa R$ 21,12/ano para assegurar o funcionamento da Justiça do Trabalho. É um custo muito baixo levando-se em conta a extensão do benefício. O dobro disso é o que se gasta Brasil afora. Atingir, pelo menos, a média nacional é o mínimo que se pode almejar em curto espaço de tempo para começar a sanear as agruras que entravam a agilidade na justiça do Trabalho do Piauí, ainda na sua fase de puberdade. Que a maioridade lhe seja mais alvissareira.

*Pedro Laurentino Reis Pereira é técnico judiciário, lotado no arquivo geral do TRT

*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1

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