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*Por Miguel Dias Pinheiro

Imagem: ReproduçãoClique para ampliarMiguel Dias Pinheiro(Imagem:Reprodução)Miguel Dias Pinheiro
 No final de 2014, a classe jurídica do Piauí foi surpreendida com uma lei estadual prevendo sobre a regulamentação da visita em presídios do estado. O fato nos remete a uma discussão sobre a competência constitucional do Estado do Piauí para aprovar e sancionar uma lei penal que trás em si uma competência penal-administrativa.
 
Como conhecemos, juntamente com a mudança da parte geral do Código Penal houve a promulgação da Lei Federal n. 7.210, de 11 de julho de 1984 - Lei de Execuções Penais -, legislação essa que regula especificamente a execução das penas e das medidas de segurança, que trouxe diversas garantias aos presidiários e disciplinou o modo de cumprimento das penas e as visitações em presídios.
 
Eugenio Raúl Zaffaroni e José Henrique Pierangeli dizem que “a relação do direito penal com o direito constitucional deve ser sempre muito estreita, pois o estatuto político da Nação – que é a Constituição Federal – constitui a primeira manifestação legal da política penal, dentro de cujo âmbito deve enquadrar-se a legislação penal propriamente dita, em face do princípio da supremacia constitucional”. 
 
Consoante o entendimento do professor Luiz Flávio Gomes, ex-magistrado, somente a União está autorizada a legislar sobre Direito Penal. Ela é o único titular do “jus puniendi”, logo, cabe a ele a produção material do Direito Penal Objetivo (ou seja, cabe à União a criação das normas que compõem o ordenamento jurídico-penal).
 
Entretanto, como do conhecimento do operador do Direito, os estados-membros podem legislar sobre a segurança em presídios, que não é propriamente uma norma inserta ao Direito Penal, sobretudo em questões específicas de interesse local. Muito embora considerado como tema fundamental, o direito do preso a visita vem previsto na Lei de Execuções Penais, devendo o estabelecimento penal submeter o material transportado pelo visitante (inclusive ele próprio) a uma busca pessoal rigorosa, a fim de evitar a entrada de drogas, armas ou objetos que possam comprometer a boa ordem, disciplina e a segurança do presídio.
 
Quando a Assembléia Legislativa do Piauí aprovou a lei sobre visitas em nossos presídios, de autoria do deputado Luciano Nunes, uma polêmica tentou se estabelecer sobre o assunto, mas sem razão alguma. A lei, inclusive, é avançada e atende a critérios de política criminal. A iniciativa do parlamentar não deixa e nem deixará de ser louvável. 
 
A Resolução n. 01, de 30 de março de 1999, do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária (CNPCP), materializou esse direito à visita estabelecendo que: “a visita  íntima  é  entendida como  a  recepção pelo preso,  nacional  ou estrangeiro,  homem  ou  mulher,  de  cônjuge  ou  outro  parceiro,  no estabelecimento prisional  em  que  estiver  recolhido,  em  ambiente  reservado,  cuja  privacidade  e inviolabilidade sejam asseguradas (art. 1º)”.
 
No seu art. 7º, a Resolução é taxativa, permitindo aos estados-membros a competência para o controle administrativo, quando reza sobre uma delegação de competência: “Incumbe à direção do estabelecimento prisional o controle administrativo da visita íntima, como o cadastramento do visitante, a confecção, sempre que possível, do cronograma da visita, e a preparação de local adequado para sua realização”.
 
Entendo, pois, que a lei aprovada na ALEPI não se trata de uma interferência na competência privativa da União para legislar sobre Direito Penal e sobre a Lei de Execuções Penais. Trata-se, a meu ver, de previsão legal que apenas vem socorrer o controle administrativo nos presídios, sem interferir no cumprimento e/ou execução da pena privativa de liberdade do apenado, mas com a visão voltada para o princípio da dignidade humana, quando normatiza que se preservem a integridade física, psicológica e moral do visitante revistado.
 
Para reforçar a iniciativa do deputado piauiense, trago à colação uma decisão do juiz Sidinei José Brzuska, em Porto Alegre-RS, responsável pela fiscalização dos presídios gaúchos, que determinou que aquele Estado passasse a considerar a regulamentação de São Paulo, que determina que os visitantes sejam submetidos à revista mecânica, em local reservado, com equipamentos como detectores de metal e raio-X. Ele classificou a revista íntima nos moldes convencionais como "vexatória, humilhante e violadora da dignidade e da intimidade, que obrigava o visitante a despir-se na presença de outras pessoas, fazer agachamentos, arregaçamentos, saltos nus ou exames clínicos invasivos”.
 
"Assim, estatisticamente, o procedimento vexatório da visita íntima, ou sua eliminação, pouco ou nada impacta na segurança da unidade", sentenciou o juiz. E concluiu: "Deve, portanto, ser banida a revista íntima vexatória no Presídio Central de Porto Alegre, cabendo o Poder Público instituir meios e adotar medidas especializadas, mais modernas do ponto de vista tecnológico, para fiscalizar o ingresso de pessoas e materiais no interior dos estabelecimentos prisionais."

* Miguel Dias Pinheiro é advogado

*** Este texto não reflete, necessariamente, a opinião do GP1

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