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Indígenas da Amazônia recebem treino de drones para proteger floresta

Grupos são capacitados para registrar dados que ajudem no acompanhamento de cheias e queimadas.

Terras indígenas na Amazônia têm sido invadidas por caçadores ilegais, grileiros, desmatadores e garimpeiros. Sobre o futuro, o conhecimento tradicional de várias das comunidades espalhadas pela maior floresta tropical do mundo também não deixa dúvidas: o clima está mudando. Pesquisadores agora querem mostrar que novidades tecnológicas - como drones e aplicativos - podem ajudar as comunidades tradicionais a frear esse problema.

Estudo feito a partir do Conselho Indígena de Roraima (CIR) identificou que muitas das comunidades indígenas da região não sabem direito o que significa mudanças do clima. Mas quando se pergunta sobre o tempo, se ele realmente está mudando ou não, vários registros interessantes são obtidos. O sempre bem marcado período do verão e do inverno, que em Roraima dura seis meses cada, não é mais o mesmo. Os ciclos de chuva (associados ao inverno) estão cada vez mais difíceis de serem previstos, o que interfere diretamente na agricultura familiar.

“Por isso é importante, para enfrentar todas essas situações, um casamento harmônico entre conhecimentos tradicionais indígenas, ciência e tecnologia. Os dois precisam ser tratados como pesos iguais”, afirma Martha Fellows, pesquisadora do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (Ipam). A partir disso é que várias instituições do terceiro setor vêm desenvolvendo ações de capacitação e de desenvolvimento tecnológico em conjunto com as comunidades indígenas da Amazônia nos últimos anos.

O trabalho em Roraima, a partir da coordenação ativa do CIR, tem gerado frutos. Até hoje, mais de 200 agentes ambientais indígenas foram formados, processo que continua em andamento. O foco é centrado em quatro eixos principais: mudanças climáticas, monitoramento ambiental, queimadas e cheias.

“No CIR, em Roraima, existe o Laboratório de Geoprocessamento muito bem estruturado, onde vários tipos de informações sobre os territórios são processadas”, explica Martha. Os trabalhos são coordenados pelo pesquisador Genisvan André, do povo Macuxi. Um dos principais trunfos do trabalho é a associação entre tecnologia de ponta e a observação feita pelos olhos de milhares de indígenas espalhados pela floresta. Casamento que está embarcado em um aplicativo para celular, o Alerta Clima Indigena.

Como explica Typju Myky, da Aldeia Japuira, para os próprios parentes em vídeo explicativo sobre a ferramenta, por meio dela, sem a necessidade de internet, pode-se registrar de tudo. Desde os melhores pontos de coleta ou de caça, até locais que estão sendo invadidos por caçadores, garimpeiros ou desmatadores.

Podemos criar alertas bem fáceis durante as expedições que fazemos, caminhando”, explica o jovem indígena. Como tudo precisa ser georreferenciado, cada terra indígena pode consultar, e gerar, alertas específicos. Até o uso dos conhecimentos tradicionais, usado na coleta de alguma planta, por exemplo, pode ser registrado. “Funciona não apenas para as coisas ruins. Até as áreas sagradas identificadas por eles podem ser marcadas”, explica Martha.

Com o objetivo de dar cada vez mais autonomia para as comunidades indígenas mapearem e, quando necessário, protegerem seus territórios, outras atividades em curso hoje na Amazônia envolvem a realização de cursos de capacitação para que as novas tecnologias possam ser incorporadas no dia a dia das aldeias.

No ano passado, uma das programações montadas pelo projeto Bem Viver em parceria com o Ipam, envolveu a pilotagem de drones. Os cursos, oferecidos com a intenção de fortalecer o monitoramento e a gestão territorial, ocorreram tanto na Amazônia Legal quanto no Pantanal. Eles foram ministrados para indígenas dos povos Kadiwéu, de Mato Grosso do Sul, e dos Macuxi, Wapichana, Taurepang e Patamona, de Roraima.

Apps e satélites

No fim de 2021, outras lideranças indígenas receberam aulas sobre como aproveitar ferramentas de análise de monitoramento ambiental e territorial utilizando dados de satélites. Os cursos, também realizados em parceria pelo projeto Bem Viver e o Ipam, capacitaram 17 indígenas Macuxi e Wapichana para utilizarem tanto o aplicativo Alerta Clima Indígena (ACI) quanto o Sistema de Observação da Amazônia Indígena (Somai) na gestão de Terras Indígenas. Participaram da iniciativa, homens, mulheres e jovens das regiões Raposa, Baixo Cotingo, Surumu, Serra da Lua, Tabaio, Murupu, São Marcos e Alto Cauamé.

A plataforma Somai, outro produto desenvolvido nos últimos anos em conjunto entre cientistas e indígenas, reúne uma série de dados científicos que buscam mostrar a importância que a floresta tem para o embasamento de ações de mitigação das mudanças climáticas globais e manutenção do equilíbrio ambiental regional. “É o desenvolvimento de uma tecnologia social. A ideia é que as comunidades não sejam apenas reativas aos problemas, mas que realmente façam o planejamento das áreas, de onde vão plantar, como será o uso da água, e assim por diante”, afirma Martha Fellows, do Ipam.

E, para isso, como mostra o audiovisual Quentura – um filme sobre as percepções das mulheres indígenas da Amazônia brasileira em relação às mudanças climáticas –, o conhecimento de quem vive na floresta é essencial. A obra, feita em 2018 pela Rede de Cooperação Amazônica em parceria com o Instituto Catitu e com apoio da Rainforest/RFN e das organizações membro da rede, mergulhou em comunidades do Rio Negro/Amazonas, da Terra Indígena Yanomami (Comunidade de Maturacá/Amazonas) e das mulheres kaxinawá da Terra Indígena do Rio Jordão/Acre.

A partir das roças, casas e quintais, mulheres indígenas dos grupos amazônicos Desana, Tukano, Tariano, Baré e Kaxinauá, Wapixana, Xawandawa e Yanomami falam sobre as transformações recentes do cotidiano, que “nem os espíritos estão conseguindo entender”. Entre elas, a diminuição dos peixes dos rios e o aumento de casos de gripe entre as crianças por causa do desmatamento e das queimadas.

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